No ateliê, cercado pela magia de grandes felinos e mulheres avatares, Leopoldo Martins mostra sua nova fase, trabalhada no aço, ele sempre surpreende com sua obra.
Insta: LEOPOLDO MARTINS
Bem cedo, quando faz a curva da rua onde fica seu ateliê, Leopoldo Martins, com o semblante aberto de quem parece sorrir para a vida, costuma pensar: “Mais um dia com muitas coisas a fazer”. É ali nos quatro galpões de pé direito generoso, localizados em um terreno de quatro mil m2 em uma região próxima a Belo Horizonte, que ele se dedica ao seu ofício e arte, acompanhado por seus auxiliares, em particular Cleber Gomes, que está com ele há mais de 15 anos. Eu e Leopoldo Gurgel fomos lá conhecer de perto esse espaço que, para o artista, é onde as ideias fluem, onde aflora a intuição e o prazer pelo fazer arte.
Como é dado a quem faz tudo com gosto, acontece com Leopoldo de, depois de um dia inteiro em atividade, nem perceber que entardeceu e o sol se prepara para sair de cena. “Aqui, nem sinto o tempo passar”, revela. No começo, Leopoldo não imaginava que iria se dedicar à escultura. Achava que seu caminho passava pela arquitetura, talvez a publicidade. Por muito tempo trabalhou com moda e, nessa época, começou a desenhar anéis com suntuosas pedras preciosas e uma assinatura autoral muito peculiar.
A amiga e cliente Sônia Ebling, escultora premiada, conhecida pelas formas depuradas, exaustivamente elaboradas e equilibradas de seu trabalho, gostava muito de suas peças: “Leopoldo, seus anéis são verdadeiras esculturas”, dizia. Um dia, indagou o amigo porque ele não se propunha a realmente esculpir algo.
“Eu ainda nem imaginava o que faria e me veio em mente os grandes felinos. Quando comentei com a Sônia, ela me disse que, se eu fizesse um, ela o fundiria para mim”, lembra o artista. E assim criou o primeiro, pequeno e, depois da primeira experiência, nunca mais parou. Hoje eles estão em vários países, em praças públicas, em instituições e residências mundo afora.
As ‘feras’ de Leopoldo Martins tem proporções realistas, porém sem muitos detalhes. São limpas nas formas e se ancoram no movimento do animal, mesmo quando em repouso. Inspiradas em diversas espécies, tem tamanhos variados: de 30 cm a 3m as maiores, entre estas inclusive, duas que estão na China: um tigre que virou atração em uma praça de Wuhan, e uma pantera que impressiona os visitantes em um parque de Xangai.
Geralmente são feitas em bronze, em patna preta, mas não é regra. Podem ser vistas em hortoftálica, material contemporâneo que aceita diferentes cores para as jaguatiricas, onças, pumas, leoas, leões e jaguares, entre tantos outros felinos, cada um com sua personalidade e suas características.
O sucesso dessas esculturas acompanha Leopoldo Martins até hoje e, mesmo assim, elas não ofuscam novas possibilidades e testes de um artista irrequieto. Depois de explorar as curvas de seus bichos selvagens, as formas humanas ganharam vida na série batizada Musas. Diferente da superfície lisa dos felinos, essas mulheres alongadas como um avatar ganharam texturas, cada uma a sua, e parecem gigantes, das menores, que medem 25cm, até as que fazem jus ao adjetivo, com cerca de três metros de altura.
Entre as exposições emblemáticas, uma se destaca: 59 musas, de tamanhos variados, ocuparam os jardins do Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, cidade natal do artista. Nessa época Leopoldo conheceu o também mineiro Ricardo Fernandes, com galeria em Paris e muitos contatos pelo mundo, principalmente na Europa e Ásia e foi por ele convidado para fazer parte de seu portfólio.
Após realizar inúmeras mostras, no Brasil e no exterior, o artista atualmente está em uma nova fase de seu trabalho, na qual abandona figurativo e mergulha no abstrato, porém sem perder a identidade pulsante que lhe é peculiar. Batizada de Insetos, a série trabalhada no aço lembra, segundo o próprio artista, exoesqueletos dessa fauna diminuta traduzida para formatos maiores que o natural. O aço é também utilizado em chapas com diversos acabamentos: “É abstrato, mas tem um pouco dessa história da asa dos insetos, que podem ser multicoloridas ou mesmo refletir o ambiente”, define.
Há em Leopoldo Martins essa mistura de empenho, força e intuição, que soma ainda sua sensibilidade e sua paixão. O que o move a criar talvez seja tudo aquilo que sua alma clara queira iluminar, ao trazer do imaginário para o concreto de seu trabalho, um pouco dele em tudo o que faz.
O que ele fala resume bem sua arte: “É uma viagem mesmo. Não sei o que vai acontecer, mas estou gostando do que está acontecendo”.
Esta matéria foi feita para o projeto Ateliê Aberto, do TENDÊNCIAS.
FOTOS: ÁLVARO FRÁGUAS
VÍDEO: PAULA DANTE