Grupo Corpo como leve pluma pousa

Nesse momento suave coisa nenhuma, companhia anuncia nova obra, parceria com o Palavra Cantada de Paulo Tatit e Sandra Peres

Insta: Grupo Corpo

Quando tudo parece mais pesado do que seria suportável, algumas levezas nos roçam como um alento, como um sopro que nos mantém no aqui e agora, a nos lembrar o nosso centro para seguir em frente. Essas plumas abstratas geralmente são crias das artes. Uma música, uma tela, uma peça, uma voz, gestos, palavras, um desenho. E entre elas, uma que conforta e emociona plateias ao vivo ou online, vem do Grupo Corpo e se anuncia não como um sopro, mas uma brisa que vai chegar a qualquer hora para nos lembrar dessa leveza tão necessária.

A boa nova é a nova coreografia anunciada para estrear quando for possível e, se possível, ainda este ano, mas que já está em andamento, quase finalizada. Rodrigo Pederneiras tem enfrentado esse desafio, na missão de coreografar com tantas medidas restritivas. “Ficamos oito meses parados, sem fazer absolutamente. Não dava para trabalhar com o grupo. Quando deu uma liberada, começamos a fazer pequenas coisas”, conta. Embora nesse momento os bailarinos estejam novamente impossibilitados de ensaiar, a arquitetura do novo trabalho já está quase em ponto de bala.

A inspiração veio das músicas do Palavra Cantada, formado pelos paulistanos Paulo Tatit e Sandra Peres, selo que há anos tem renovado a música brasileira voltada para crianças, com o alto nível de qualidade poética e musical em tudo o que produzem. Um trabalho em que o foco não está somente nas letras, mas na riqueza dos arranjos, no apuro das produções e no tratamento esmerado dado às melodias.

E é exatamente essa riqueza musical que chamou a atenção de Rodrigo Pederneiras. Portanto, não se trata de uma coreografia voltada para o público infantil. “É genial o que eles fazem, porque não abrem concessão para a qualidade. Liguei para o Paulo Tatit, conversamos e pedi que ele nos enviasse só as músicas, sem letras. Ele adorou a ideia. Eles me enviaram várias com orquestra e outras com violão acústico, contrabaixo e bateria, que foram as escolhidas, já que optamos por um espetáculo com poucas pessoas no palco”, explica.

Trecho do espetáculo Lecuona, de 2004.

A experiência já aconteceu em Lecuona, em 2004, quando a companhia interpretou composições do cubano Ernesto Lecuona, com coreografia praticamente construída a partir de pas de deux – trecho do balé dançado geralmente por um bailarino e uma bailarina. Desta vez, os solos, duos e, no máximo, trios, estão atrelados a uma realidade que impõe o distanciamento social. Portanto, o trabalho tem sido desenvolvido com todo mundo usando máscara, álcool em gel pra todo lado e a opção segura de que, para que houvesse contato físico, ele também estaria submetido ao momento de pandemia. “As limitações são muito grandes, eu não posso fazer um pas de deux  com quem não está convivendo diariamente. Como temos três casais que moram juntos, as duplas foram formadas por eles”, explica Rodrigo, que fala ainda da empolgação contagiante dos bailarinos.

 “Estava todo mundo louco pra trabalhar, todo mundo começou a fazer aula em casa. O Paulo (Pederneiras, diretor geral e artístico da companhia), mandou fazer umas barras de pvc, mandou cortar linóleos que foram enviados para a casa dos bailarinos, para que todo mundo continuasse no pique”, conta.

Quando a peça estava quase pronta, tudo dando certo, há poucos dias o grupo teve que interromper o trabalho. “Todo mundo ficou chateado, mas a gente parou porque não dá para correr risco e não temos urgência, essa premência de fazer algo rápido”, comenta.

Até aqui, o que sabemos é que, sim, teremos um novo espetáculo do Grupo Corpo para assistir, assim que possível. Nada de tristezas, nada pesado. Algo para cima, cheio de vida. “Vamos apresentar algo que possa divertir as pessoas, bem alto astral. É tudo abstração”, resume Rodrigo. Sem ansiedade, mas com expectativa do deleite que sempre é assistir o Corpo no palco, a gente aguarda o momento em que as cortinas vão se abrir, seja ao vivo ou no meio digital. Importa agora é saber que essas “plumas” estão por aí, roçando a nossa ideia, nossa vontade e nossa necessidade de consumir mais arte.

Trecho do Workshop virtual, durante a Pandemia.

Fotos: José Luiz Pederneiras

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