Amigo, colega de trabalho, arquiteto, professor e muito mais. José Eduardo Ferolla deixa sua marca única em construções e corações
É estranho quando nos encontramos com uma pessoa e, no dia seguinte, ela não está mais aqui. Quer dizer, não está palpável, mas, talvez assim, nesse repentino modo abstrato, desperte em quem esteve próximo outros sentidos, outras emoções.
Para muitos que conheceram o arquiteto José Eduardo Ferolla, de muito tempo ou das últimas semanas, da sexta-feira passada talvez, o último sábado foi simbólico. Aos 75 anos, Ferolla, como todos o chamavam, se despediu dessa convivência diária muitas vezes tão banal, tão banal, tal qual somos. Muitas vezes.
Deixou um legado de muitos amigos, muitos alunos que o admiravam, muitos projetos, executados ou não, de residências, edifícios comerciais e institucionais, plano diretor de cidade, e muito mais. Deixou marcas na cidade e nas pessoas, com seu jeito cortês e generoso.
Para além do arquiteto, como professor da UFMG por mais de quatro décadas, era extremamente técnico e conhecedor da disciplina. Não deixava passar um detalhe e, ao mesmo tempo, era absurdamente respeitoso e cuidadoso ao avaliar cada projeto. Não por acaso foi homenageado por várias turmas da arquitetura.
Vida de arquiteto é muito isso: muitos projetos não são concretizados e, nem por isso, recebem menos empenho. Com participação e premiação em concursos nacionais e internacionais, Ferolla foi um desses. Seu projeto para a Biblioteca de Alexandria, no Egito, mereceu destaque, ficando em 3º lugar.
Há outros momentos emblemáticos de concursos, como quando participou de um, em Porto Alegre e ele (e toda a equipe) resolveu contrariar o edital por não concordar com alguns tópicos. Claro, foram sumariamente desclassificados. Ainda assim, o projeto foi resgatado ao final e premiado com uma bela menção honrosa.
Marcado pela coerência, o rigor que empregava junto aos alunos, com os quais discutia cada projeto como uma obra a ser executada, era o mesmo que exercia em seu escritório. E lá, como arquiteto, também não era um homem de escritório. Gostava de estar nas obras, acompanhando tudo muito atento e atuando em diversas escalas.
Ferolla era um profissional inquieto, que gostava de discutir e de buscar incessantemente outras alternativas. Uma inquietude que favorecia o refinamento de soluções técnicas e tecnológicas de seus projetos.
Um dos mais icônicos, o edifício de escritórios Palladion, localizado no bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte, talvez resuma seu jeito de ser. Uma obra que não grita, que não quer aparecer mais que as outras, mas que se destaca pela personalidade e pela qualidade arquitetônica.
E assim foi com várias outras: o Centro de Eventos da CDL em Formiga, o CTE – Centro de Treinamento Esportivo da UFMG, o Mercado Distrital do Barroca (já demolido), o Centro de Convenções de Ouro Preto.
Em muitas das residências que projetou, uma das características da construção é a de abraçar espaços abertos, transformando-os em jardins ou áreas contemplativas. Ambientes criados a partir do construído.
É comum escutar dos amigos, colegas de trabalho e alunos de Ferolla que, para ele, qualquer coisa, um mínimo acontecimento em um dia qualquer podia virar um caso a ser contado, com detalhes e encantamentos.
A Casa Ferolla, seu projeto mais recente e ainda em execução, que em breve será palco da CASACOR Minas, tem muitas dessas histórias impregnadas na construção. O projeto inclui um edifício contemporâneo ao lado de um preservado casarão dos anos 1940, onde o arquiteto viveu boa parte de sua vida.
Homenageado em vida, ele conserva um pedaço de sua memória em uma esquina charmosa do bairro Santo Antônio, em BH.
(Esse texto é fruto de conversas com amigos e colegas de trabalho de José Eduardo Ferolla, entre eles os arquitetos Jô Vasconcellos, Eduardo França, Fernando Ramos, Sérgio Palhares)
FOTO DE CAPA – CENTRO DE TREINAMENTO ESPORTIVO DA UFMG. FOTO DE JULIANO NEMER