Notáveis e inusitados

As peças têm humor, tem história e também o talento de três designers mineiros à frente do Cultivado em Casa

Insta: Cultivado em Casa


Os três designers à frente da marca Cultivado em Casa costumam trabalhar exatamente dentro do conceito passado pelo nome que escolheram para se apresentar ao mercado. Para chegarem ao produto final, é como se separassem uma semente muito especial a ser plantada, adubassem previamente a terra para recebe-la e depois esperassem o broto vingar, acompanhando o seu crescimento e fazendo as invenções necessárias até chegar ao resultado pretendido.

A pesquisa, dos materiais à forma, do projeto à execução, passa por questionamentos intensos, que garantem a tudo o que esse trio faz história, qualidade e originalidade. Não por acaso, as peças do Cultivado em Casa têm encantado não só o mercado nacional como o de outras partes do mundo. Vendidos principalmente pelos sites Boobam e Muma, eles alcançam novos públicos nos Estados Unidos principalmente, mas também no continente europeu e até nos Emirados Árabes. Por esses dias, a marca inaugura uma loja online no próprio site, já que a venda direta acontece também pelo whatsapp, onde as pessoas querem saber mais detalhes do que é postado em suas redes sociais.

Bárbara Meirelles, Diego Garavinni e Mikael Dutra se conheceram no curso de Design de Produto da Fumec-BH, onde formaram entre 2011 e 2012. A aproximação se deu pela visão estética e a linha de pensamento em design em comum entre os três. Assombrados com a realidade do mercado, que parecia não ter espaço para o que eles, de fato, pensavam em produzir, começaram a desenvolver a ideia de montar um estúdio, o que veio a se concretizar entre 2013 e 2014. “Trabalhamos um bom tempo em cima da primeira coleção, porque já queríamos entrar no mercado, que a gente ainda não conhecida, com um portfólio mais elaborado”, lembra Diego. As cinco primeiras peças lançadas já apresentavam a visão de um design de experimentação, de subverter funções, levando curiosidades e simbolismo para os produtos.

Diego explica ainda que o nome Cultivado em Casa está em sintonia com a proposta, de criar objetos de mobiliário para a casa, lugar nutrido com um carinho enorme pelos três profissionais. “Costumamos trabalhar em casa, nas pesquisas, nos testes, criando em cima de modelos, além do nosso trabalho também ter o aspecto do manual, do caseiro. A tudo isso soma a nossa relação com o cliente, sempre muito próxima”, diz.

É o que demonstra as peças Açafrão e Urucum, por exemplo, três luminárias de diferentes tamanhos. Convidados pelo designer Pedro Haruf para compor uma exposição no Mercado Novo de Belo Horizonte em 2019, junto com outros designers e artistas que também tinham o desafio de criar a partir de algo que já existisse lá dentro, eles mergulharam na proposta, atentos a cada cantinho de um espaço povoado por gráficas, serralherias, serviço de torneiro mecânico, entre outros. “Fomos lá algumas vezes despretensiosamente e acabamos descobrindo uma fabriqueta que vendia coloral e açafrão em pó, no peso. Começamos a pensar sobre a estética do mercado, sempre inundado pelo cheiro de comida, de temperos e por muita cor e, nesse processo surgiu a luminária. Chegamos nesse desenho meio bicho, meio gaiola, desenvolvemos o material, o papel marché, feito com sobras de gráficas do próprio mercado, em cuja massa acrescentamos o açafrão e o urucum, que foi aplicada sobre uma estrutura de metal soldado”, explica Diego. Por fim, queriam algo que acendesse. Estava criada a luminária, que embora seja produzida até hoje, continua como peça numerada, colecionável.

A Cadeira De 56 Petecas também é carregada de história, sem perder o apelo do inusitado. Foi Mikael quem chegou um dia com uma peteca, imediatamente vista como objeto de curiosidade e estudo dos três. Nas pesquisas que começaram a fazer, descobriram que o artefato indígena já existia antes mesmo da chegada dos portugueses, e era utilizado por tribos situadas no território de Minas Gerais. À época, feito com penas de aves, palha de milho e o próprio grão, que lhe dava certo peso. Junte a toda essa informação o fato de que foi Belo Horizonte o primeiro lugar em que a peteca, tal qual a conhecemos hoje, se firmou como esporte, ganhou regras e foi difundida para outras regiões. Diante de tanta riqueza histórica e também da estética do artefato, a criação da Cadeira De 56 Petecas ganhou ainda novos contornos: traz um pouco da memória dos povos originais pelo objeto e pelo encosto, que remete a um cocar de índio e ganha, ainda, um toque minimalista.

Sobre a próxima coleção, ainda não batizada, ela também parte da busca de novos usos para objetos que estão presentes no nosso cotidiano: tubos de aço em curva de 180 graus, geralmente utilizados como corrimão de praças e outros lugares públicos. Mas, sobre ela, a gente vai falar da próxima, ok?

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