Centro Cultural Presidente Itamar Franco, que abriga sede da Filarmônica de Minas Gerais, é um marco da arquitetura na capital
Insta: Orquestra filarmônica de Minas Gerais – Jo Vasconcellos – Rafael Yanni
Há um sentimento forte ao chegar ao Centro Cultural Presidente Itamar Franco, em Belo Horizonte. Para um leigo, que passe pela região, o sentido de urbanidade que o projeto dos arquitetos Jô Vasconcelos e Rafael Yanni dão àquela área, com uma praça que articula as áreas construídas em uma quadra da capital mineira destituída de espaços públicos de qualidade, talvez seja percebido sem que isso precise ser evidente.
Mas é impossível não ser afetado pelo conjunto ou pelos detalhes, pelos vazios, pelas proporções e volumes, ou pela cor, o amarelo, pontuado sutilmente. Um morador de BH pode ter a sensação de que a obra parece um belo parêntesis em relação ao resto da cidade, por oferecer uma dimensão que não é sentida em outras praças, outros locais públicos da capital. Ao mesmo tempo, esse parêntesis não exclui, pelo contrário, acolhe, trazendo ainda informações novas para habitantes tradicionalmente conhecidos como pessoas desconfiadas e reservadas, características interioranas que ainda tem seu lugar, mesmo em uma BH que virou metrópole.
O complexo cultural está localizado no Barro Preto, bairro da região centro-sul e é composto pela Sala Minas Gerais – com sala principal, camarins, salas de ensaios, administração, espaços de apoio e estacionamento, sede da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais – e as sedes e estúdios da Rede Minas de Televisão e Rádio Inconfidência.
As edificações foram implantadas no melhor nível de acesso do terreno, de maneira a reduzir a movimentação de terra. A disposição procurou gerar vazios entre elas, condição que propiciou a criação de uma grandiosa praça de acolhimento e lazer. “Que é oferecida para toda a comunidade e usuários em um local carente de espaços públicos, trazendo para a região uma nova identidade”, afirmam os arquitetos, destacando que o conjunto resgata e confirma o caráter e o compromisso social que, em sua avaliação, um equipamento desse porte deve contemplar.
“Foram os critérios acústicos que determinam as formas dos espaços sensíveis e a organização dos ambientes circundantes”, ressaltam Jô Vasconcellos e Rafael Yanni. “As necessidades acústicas de isolamento estrutural determinaram a implantação preferencial da grande sala de concertos sobre terreno natural, sem subsolos, e afastada das outras estruturas. Ela é implantada de forma a receber em seu nível médio o público que chega pela praça e faz circularem músicos e instrumentos diretamente no nível do palco.
Os grandes estúdios da TV também são implantados sobre terreno natural com acesso de docas e equipamentos diretamente na cota original”, eles descrevem.
Sala Minas Gerais – O arquiteto e acústico José Augusto Nepomuceno, que assina o projeto da sala de concertos disse em um texto que o trabalho dos acústicos de salas de música é muito semelhante ao de um luthier. “Lidamos com o delicado diálogo entre espaço e tempo que caracteriza as complexas relações entre arquitetura, acústica e música. E dar conta destas relações implica em definir volumes, formas, dimensões, ou seja, esculpir o vazio interno da sala.”
Desde o início, ele pensou que o projeto da Sala deveria refletir o vigor da Filarmônica: um conjunto musical jovem e com enorme força artística. A Sala não deveria repetir protótipos congelados e consagrados. Daí nasceu uma sala que reúne o conceito surround, ou em terraços como a da Berlin Philharmonie, dentro de uma orientação longitudinal, ou retangular, como da Sala São Paulo e da Boston Symphony Hall. “Por isso trouxemos o envolvimento e a proximidade da tipologia em “terraços”, com os atributos acústicos das salas em forma de “caixa-de-sapato”.
Inicialmente foram definidas as grandes dimensões internas e a área do palco. Não apenas a área ocupada pelos músicos sentados, mas o espaço acústico que os envolve. A seguir, foi definido como a plateia se acomodaria ao redor do palco, planejando vários temas em conjunto: visibilidade, envolvimento, acústica e percepção espacial. Cada superfície e cada vazio estão relacionados aos equilíbrios que definem a qualidade da escuta sensível.
Muitos elementos da Sala nasceram do processo de avaliação em modelos. “As grandes paredes superiores e curvas – que chamamos de “velas” – nasceram para controlar a difusão sonora (espalhar o som para diferentes direções) e a quantidade de volume de ar interno na Sala. O nome velas apareceu, inicialmente, para encurtar paredes superiores curvas, e acabou pegando. São como velas de embarcações para a música navegar pela Sala e para o público embarcar na música”, reforça Nepomuceno.
As paredes, estruturas e instalações foram projetadas para manter silêncio dentro da Sala. Condição absolutamente necessária para a escuta sensível. Todo esse trabalho, nas áreas externas e internas, que envolveu os arquitetos Jô Vasconcellos, Rafael Ianii e José Augusto Nepomuceno, culminam na inserção de Belo Horizonte nas redes mundiais de cidades criativas e em transformação. O complexo, definitivamente, é um marco da cidade.
FOTOS DO ACERVO DO CENTRO CULTURAL PRESIDENTE ITAMAR FRANCO